Acesso à água e saneamento para o alcance da Agenda 2030
2/fev/2018
Especialistas apontam que demanda global por água tem aumentado 1 por cento ao ano, principalmente nos países em desenvolvimento. Foto: Isabelle Marie/IPC-IG.
A demanda mundial por água tem aumentado, em média, 1% ao ano, principalmente nos países emergentes. Em um cenário mundial em que a mudança do clima ameaça deixar 3,6 bilhões de pessoas em situação de escassez de água, discutir a preservação e a gestão dos recursos hídricos é essencial. Esse foi um dos alertas feito por especialistas brasileiros e estrangeiros durante o “Seminário Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e os Desafios para a Gestão da Água e do Saneamento no Brasil”, realizado nesta última quinta-feira (01/02) em Brasília.
O seminário contou com a presença de especialistas brasileiros e internacionais, gestores públicos, pesquisadores, representantes do setor privado, de organizações do terceiro setor e da sociedade civil para debater a relação entre água, meio ambiente e desenvolvimento sustentável. O propósito principal do evento foi reunir as contribuições dos principais estudiosos em água e saneamento básico do país na implementação do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 6 (Água potável e saneamento), da Agenda 2030.
Na abertura do evento, o Presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Ernesto Lozardo, destacou a importância dos ODSs para o trabalho da instituição e para o futuro do país.
"O importante não é pensar de forma isolada, mas pensar em uma região, em um país, é importante pensar em toda a sociedade", disse Lozardo.
Niky Fabiancic, coordenador-residente do Sistema Nações Unidas no Brasil, representante-residente do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e Diretor Interino do IPC-IG, ressaltou que , apesar do significativo avanço nas últimas décadas, a falta de acesso a serviços de esgotamento sanitário persiste e atinge as famílias mais pobres, tendo um impacto negativo no crescimento inclusivo.
“Sabemos que parte dos desafios reside em questões como a viabilização dos custos de investimento para universalizar o acesso aos serviços e ao aumento da coleta e do tratamento dos esgotos domésticos “, disse ele.
Fabiancic disse ainda que o tratamento de águas residuais é outro ponto que exige atenção de governo e sociedade. “A maior parte das atividades humanas que usam água produzem águas residuais, mas o planejamento e a gestão do reuso ainda é pouco explorado. Um estudo recente da UNESCO mostra que 70% das águas residuais urbanas e industriais, em média, são tratadas nos países de renda alta. Essa proporção cai para 38% nos países de renda média-alta, para 28% nos países de renda média-baixa e para apenas 8% nos de renda baixa”, disse.
Já o secretário Nacional de Articulação Social da Secretaria de Governo da Presidência da República e Secretário Executivo da Comissão Nacional dos ODS, Henrique Villa da Costa Ferreira, destacou a importância da gestão de água e saneamento para o desenvolvimento sustentável do país.
"O ODS 6 tem duas grandes metas que falam do desafio do Brasil com o desenvolvimento sustentável: a água para todos e o saneamento. Pouco menos de 60% da população brasileira tem acesso ao esgotamento sanitário. A gente precisa ser agressivo para entregar algo próximo da meta até 2030 e eventos como esse são fundamentais para isso”, disse ele.
Para a Diretora-Presidente da Agência Nacional de Águas (ANA), Christianne Dias Ferreira, ‘’a tarefa a que se propõe este seminário terá desdobramentos de enorme importância para o país e para essa temática’’. Por sua vez, o Diretor de Geociências do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Wadih Scandar Neto, ressaltou a importância do monitoramento do progresso do país na direção do atingimento das diversas metas da Agenda 2030.
O seminário foi dividido em quatro painéis temáticos: acesso à água potável e ao esgotamento sanitário; qualidade da água, proteção e restauração de ecossistemas; eficiência do uso da água; e gestão integrada de recursos hídricos e participação da sociedade. No primeiro painel da manhã, o principal ponto destacado pelos especialistas foi o déficit no saneamento básico nas áreas rurais do Brasil.
“Quando olhamos as áreas urbanas, hoje nós temos mais de 82% dos domicílios servidos por rede coletora ou fossa. Em 2030, queremos chegar a 100% dos domicílios atendidos. Na área rural hoje só 35% da população é atendida, queremos chegar a 70% em 2030’’, disse o Gerente de Projetos da Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades (MCid), Marcelo Lelis.
O Presidente do Instituto Trata Brasil, Édison Carlos, e o Presidente da Associacão Brasileira das Empresas Estaduais de Saneamento (AESBE), Roberto Cavalcanti Tavares, coincidiram na defesa pela criação de um grande pacto liderado pelo Governo Federal que incentive governadores e os prefeitos a assumirem o papel de titulares do saneamento.
“O Governo Federal precisa encontrar uma saída técnica para apoiar os municípios. Se a gente olhar para o interior do Brasil, os prefeitos não têm a menor ideia de como sair da situação em que eles estão. As empresas estaduais não têm condições de tratar 1200 cidades pequenininhas com o recurso que eles recebem das capitais.” , disse Édison Carlos.
O Coordenador da Equipe Técnica Regional de Água e Saneamento da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e da Organização Mundial de Saúde (OMS), Teófilo Monteiro, disse que, por falta de acesso a saneamento adequado “18,5 milhões de pessoas defecam ao ar livre” na América Latina.
No debate sobre a qualidade da água e a proteção e restauração dos ecossistemas, os especialistas defenderam que a proteção dos ecossistemas é fundamental para a preservação da água.
“O Cerrado é a grande caixa d’água do país, as grandes bacias do Brasil nascem aqui, mas ele também é um dos biomas mais ameaçados. Redução dos riscos de desastres ambientais, como deslizamentos de encostas, enchentes e secas, são de fundamental importância para a manutenção dos recursos hídricos no Brasil’’, disse o professor do Departamento de Ecologia da Universidade de Brasília, Bráulio Ferreira
A qualidade das águas reflete a gestão do saneamento ambiental, do solo e do lixo, para o Presidente e pesquisador do Instituto Internacional de Ecologia e Gerenciamento Ambiental, Secretário Municipal de Desenvolvimento Sustentável, Ciência e Tecnologia de São Carlos e professor da Universidade Feevale, José Galizia Tundisi, e a Coordenadora do Programa Rede das Águas da Fundação SOS Mata Atlântica, Malu Ribeiro.
‘’A medida em que houve uma evolução das sociedades e dos países, houve um aumento na deterioração da qualidade da água. Hoje nós temos uma sopa orgânica dissolvida na água que tem relação negativa com a saúde humana e causa até problemas psicológicos’’, disse Tundisi.
O Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio Doce (CBH-Doce) foi representado pela presidente, Luciane Teixeira Martins, que relembrou a tragédia do rompimento da barragem de Mariana – MG, em 2015.
‘’Isso virou a discussão principal quando se fala da qualidade da água em Minas. Hoje, embora todos os laudos das empresas mostrem que a água do Rio Doce está dentro dos padrões, muitos ainda se negam a consumir’’, disse ela.
A capacitação dos gestores públicos municipais na área de saneamento foi outro ponto abordado pela presidente do CBH-Doce. A instituição auxília os governos dos municípios da Bacia do Rio Doce na elaboração de planos municipais de saneamento.
" Hoje 156 municípios da região já tem plano de saneamento básico, faltam mais oito para alcançamos a meta de ter 100% dos municípios com plano de saneamento básico", disse ela.
O seminário foi organizado pela Agência Nacional de Águas (ANA), Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Centro Internacional de Políticas para o Crescimento Inclusivo (IPC-IG), que se uniram aos principais estudiosos e especialistas em água e saneamento do país para debater os desafios do Brasil para alcançar as metas do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 6 (ODS 6) da Agenda 2030 das Nações Unidas.Os conflitos causados pelo desequilíbrio no acesso à água em situação de escassez, a melhoria da coordenação institucional para o efetivo uso múltiplo da água, um maior empoderamento da participação da sociedade e o aumento da coleta e do tratamento dos esgotos doméstico e industriais são alguns dos desafios que o Brasil enfrenta na gestão de recursos hídricos e de saneamento básico.
*Informações do IPC-IG.